EDIFÍCIO BARÃO DE IGUAPE: ORIGENS COLONIAIS E OCUPAÇÃO MODERNA
Aluno: Júlia Pimenta Borges
Orientador: Prof. Dr. Alessandro José Castroviejo Ribeiro
Apoio: PIBIC Mackpesquisa
RESUMO
A pesquisa pretendeu compreender a formação do Edifício Barão de Iguape (1959); um edifício moderno localizado na Praça do Patriarca, no Centro Histórico de São Paulo; cuja autoria foi do escritório americano SOM (Skidmore, Owings e Merril), com colaboração decisiva de Giancarlo Gasperini. Nesta época a cidade passava por um processo intenso de transformação e verticalização, consequente de avanços tecnológicos, mudanças econômicas e um novo padrão de desenvolvimento urbano. Apesar de sua arquitetura moderna nos moldes do estilo internacional, o edifício carrega também valores da arquitetura colonial, em particular as remanências do traçado das ruas e das ocupações anteriores, incorporando uma enorme carga de significados para a cultura da cidade. Foram levantados registros das ocupações anteriores do lote para compreender a formação atual do edifício. Isso implica numa reavaliação tanto da arquitetura moderna internacional, sujeita às circunstâncias locais, em particular àquelas vinculadas a uma cidade colonial tradicional; quanto à formação do atual centro histórico de São Paulo.
Palavras-chave: Arquitetura Moderna, Edifício Barão de Iguape, Centro Histórico de São Paulo
ABSTRACT
The research has intended to understand the formtation of the building Barão de Iguape (1959); a modern construction located at Praça do Patriarca, in the Historical Center of Sao Paulo. It was designed by the American office SOM (Skidmore, Owings e Merril), with the colaboration of Giancarlo Gapeerini. During these period, the city was going through a remarkable process of changes and verticalization, result of technology growth, economical changes and a new pattern of urban development. Besides its modern architecture inspired in international influences, the building also prompts some values of colonial architecture, mainly the tracing of the streets and previous ocuppations, which brings an important meaning for the culture of the city. Some data of these previous occupations were collected to anylize and comprehend the current shape of the builiding This implies in a revaluation of the international modern architecture and formation of the current historical center of São Paulo.
Keywords: Modern Architecture, Building Barão de Iguape, Historical Center of São Paulo
1. INTRODUÇÃO
O estudo feito sobre o Edifício Barão de Iguape está inserido no contexto da pesquisa “O Centro Histórico de São Paulo: documentação e estudos de reabilitação”. Diversas etapas já foram cumpridas até hoje, patrocinadas pelo Mackpesquisa. Inúmeros dados foram coletados nos arquivos do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), AHWL (Arquivo Histórico Washington Luiz), Arquivo Corrente da Prefeitura (Piqueri), fontes bibliográficas diversas e visitas de campo. Todos esses dados encontram-se armazenados no “Banco de Dados do Centro Histórico de São Paulo”, com acesso online, restrito aos pesquisadores autorizados. Parte dessas documentações aguardam complementações, revisões, relatórios e interpretações para serem liberadas à comunidade de um modo geral através do site já criado: “Edifícios no Centro de São Paulo”.
O Edifício Barão de Iguape está localizado na Praça do Patriarca. Por estar implantado entre duas esquinas, ele pode ser encontrado por três endereços diferentes (Rua São Bento, 125, Rua Direita, 250; Rua Quitanda, 157). Ele foi projetado pelo escritório americano SOM (Skidmore, Owings e Merril), com colaboração decisiva de Giancarlo Gasperini e, mais recentemente, com intervenções de Aurélio Flores. O edifício foi construído no mesmo lote que já fora ocupado pela residência de Antônio da Silva Prado (Barão de Iguape) e pela sede do Mappin Stores, trazendo assim, uma marca do lote de origem colonial para a versão final do edifício.
Com isso, a pesquisa procurou traçar e descrever as ocupações ocorridas no lote através dos mapas cadastrais da cidade de São Paulo: Planta da Cidade de São Paulo – 1881, Sara Brasil, 1930; Vasp-Cruzeiro, 1954 e Gegran, 1974; levantar no arquivo AHWL (Arquivo Histórico Washington Luiz) processos referentes às ocupações até 1923; rever referências bibliográficas; descrever os processos encontrados no Arquivo Corrente da Prefeitura (Piqueri) e atualizar todo esse conteúdo no “Banco de Dados do Centro Histórico de São Paulo”.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
O Centro Histórico de São Paulo é formado por uma estrutura urbana e um parque edificado que constituem um notável acervo de bens culturais. A atual estrutura urbana do Centro Histórico de São Paulo apresenta uma configuração cujos principais delineamentos guardam relações com os processos de ocupação que remontam às origens da formação da antiga vila colonial.
Mas, além disso, documenta as transformações sucessivas por que passou a cidade, notadamente aquelas que testemunham sua transição de vila colonial a cidade cosmopolita na virada do século XIX para o século XX. Inicialmente, a transposição do Vale do Anhangabaú permitiu a ampliação da malha urbana dando início à formação do bairro de Santa Ifigênia, em seguida os Campos Elíseos e outros que viriam a configurar a assim chamada “Cidade Nova”. Na primeira metade do século XX, a área central foi objeto de uma sucessão de projetos de “melhoramentos” e reformas urbanas que buscaram atender a vertiginosa transformação pela qual a cidade passou no período. Das diretrizes pioneiramente formuladas por Silva Telles até a reurbanização do vale do Anhangabaú, muitas mudanças ocorreram. Da mesma forma, de Silva Freire a Prestes Maia, embora os sucessivos planos urbanísticos tenham trazido grandes contribuições para a modernização da nascente metrópole, a maioria deles não se implantou integralmente, sofrendo adaptações e acomodando-se às contingências políticas e administrativas.
A partir dos anos de 1920, tem início uma intensa ocupação; logo substituída, nos anos 30 por edifícios de altura máxima de seis pavimentos, tendência à verticalização que seria potencializada a partir de 1940. Nesse território uma estrutura viária e fundiária que remonta às origens coloniais foi alargada e ampliada rapidamente. Um tecido foi constituído ao longo do tempo, nos moldes de uma cidade tradicional; guardando ainda as marcas da geografia e da história. Nesse mesmo período, sistemas construtivos e estilos são substituídos; e não raro passam a conviver juntos (RIBEIRO, 2010, P.13).
A área abrigou historicamente o polo de negócios de São Paulo. A partir da década de setenta esse polo começou a se mover gradativamente em direção à Avenida Paulista, processo que prosseguiu, mais adiante, em direção à zona sul. Apesar de parte significativa da atividade financeira persistiu no Centro Histórico, a partir do início da década nos anos 80 esse deslocamento acentuou se.
São vários os fatores responsáveis por este processo. O centro veio apresentando condições de crescente do declínio motivadas, principalmente, pelos efeitos existentes dos ciclos de obsolescência das estruturas físicas. Como isso, as atividades primordiais de serviços e comércio, típicas das áreas centrais, têm se deslocado para outras regiões da cidade, à procura de situações mais favoráveis como a presença e concentração de público consumidor de maior poder aquisitivo. Esses acontecimentos contribuem para a ociosidade de considerável número de edificações e a progressiva degradação da região central. O processo de obsolescência das estruturas edificadas constitui um obstáculo de difícil superação, face à demanda por instalações dotadas dos recursos necessários ao desempenho de atividades que exigem atualização tecnológica, num mercado altamente competitivo e dinâmico.
Essa região da cidade apresenta edifícios de grande porte que, valendo-se dos parâmetros urbanísticos vigentes na primeira metade do século XX, promoveram intenso aproveitamento dos lotes, do que resulta uma área urbana compacta de alta densidade. Trata-se de um amplo repertório de obras, compreendendo desde ocorrências pioneiras, a partir de 1925, até os exemplos característicos da arquitetura moderna dos anos 50. A possibilidade de ampliação do repertório de obras de arquitetura moderna certamente contribui para a ampliação das referências de análise deste período de produção. Esta amostragem oferece a oportunidade de revelar obras pouco conhecidas da crítica, de questionar os parâmetros de referência das várias modalidades de expressão da arquitetura moderna e, certamente, promover revisões de aspectos da historiografia da arquitetura moderna pelo exame dos exemplares consagrados a partir das fontes documentais que lhes deram origem.
Hoje, muitos edifícios do Centro Histórico encontram-se vazios, subutilizados ou em processo de transformação para novos usos. Tendo em vista a revitalização e reocupação dessa região, que foi palco de acontecimentos históricos e cujos edifícios são símbolos de sua época e, juntos, relatam a trajetória arquitetônica e cultural de toda uma sociedade, é preciso explorar o potencial de ocupação dessas construções. O estudo dos edifícios permite que tornemos público esse potencial, de forma a conscientizar o mercado imobiliário do valor cultural e de mercado dessas obras, endossando assim as diversas iniciativas já tomadas pelo poder público (CARRILHO, Santos, Ribeiro e Del Nero, 2013).
3. METODOLOGIA
Pretendeu-se alcançar a compreensão de cada um dos edifícios no contexto específico de sua realização, por meio da reconstituição histórica da ocupação do lote em suas sucessivas etapas, as edificações precedentes, os processos de remembramentos de lotes, a incidência de normas e limitações urbanísticas sobre os projetos, os pareceres de análise pela prefeitura, o exame das sucessivas versões apresentadas e as discussões de aprovação dos projetos. Vale acrescentar, por fim, a recepção, quando houver, da crítica especializada sobre a obras realizadas. Além, destes procedimentos de caráter histórico foram cumpridas as seguintes etapas de trabalho.
A revisão bibliográfica será feita em duas linhas principais: de um lado os aspectos teóricos que envolvem o surgimento da arquitetura moderna e os princípios conceituais que a definem; de outro, mediante a compilação de todas as fontes existentes sobre as obras em estudo.
3.2 Plano de Trabalho Específico proposto:
a. Levantar no arquivo AHWL (Arquivo Histórico Washington Luiz) processos referentes às ocupações até 1920;
b. Revisão e compilação bibliográfica dos antigos Edifícios Mappin Stores na Praça do Patriarca;
c. Atualizar, registrar e descrever as modificações modernas ocorridas no atual Edifício Barão de Iguape;
d. Relatório de campo (visita in loco);
e. Montagem e descrição da cronologia das ocupações no lote, por meio da cartografia, dos processos identificados e dados coletados;
f. Inserção dos elementos da pesquisa no banco dados e liberação das informações para o site “Edifício nos Centro de São Paulo”.
OBS; os itens C e D ficaram prejudicados em razão da pandemia. Visitas realizadas antes da decretação da quarentena, permitiram a identificação das mencionadas fontes, entretanto, a coleta, copilação e transferência dos dados ficaram impossibilitados.
4. RESULTADO E DISCUSSÃO
a. Levantamento dos processos referentes às ocupações até 1920 no arquivo AHWL (Arquivo Histórico Washington Luiz);
No AHWL, os processos estão separados em livros e caixas. Os processos referentes as datas entre 1884 e 1905 se encontram em livros e a partir de 1906 em caixas. Como o Edifício Barão de Iguape pode ser encontrado a partir de três endereços diferentes, foi preciso pesquisar em todas as caixas e livros referentes às ruas Quitanda, Direita e São Bento.
O processo registrado mais relevante para a pesquisa foi o processo 003.062 de 1910, referente ao pedido de construção do Prédio Barão de Iguape, feito por sua neta Condessa Pereira Pinto (Ana Brandina Prado Pereira Pinto). Nele se encontram as plantas e elevações da construção. Como consta no processo, o arquiteto responsável pelo pedido foi o arquiteto “Dr. Ramos de Azevedo”.
De acordo com o processo registrado, a área total da construção é de 859m² e seu perímetro de 88,5 metros, sendo 28,6m na Rua Direita; 3m de chanfro; 28,6m na Rua São Bento; 3m de chanfro e 25,3m na Rua Quitanda. Nas ruas São Bento e Direita, a fachada respeita o alinhamento existente e na Rua Quitanda há um recuo de 8,90m.
Com a análise dos desenhos da fachada, pode-se concluir que o edifício é composto por 5 pavimentos (pavimento térreo mais quatro pavimentos superiores). Na fachada da Rua Quitanda, são contabilizadas 28 janelas, 7 em cada pavimento superior, sendo 11 pequenas varandas. Já na fachada principal da Rua São Bento, são contabilizadas 36 janelas, 9 em cada pavimento superior, sendo 14 varandas. É perceptível que o pavimento térreo possui um pé-direito maior do que os outros pavimentos e a entrada principal se encontra centralizada na fachada da Rua São Bento, de frente para a Praça do Patriarca.
A partir da análise das plantas, pode-se dizer que todos os ambientes estão dispostos ao redor de um átrio central, assemelhando-se ao formato de um “U”. Toda a estrutura da edificação se encontra na fachada e nas paredes desse átrio. A edificação conta com cinco torres de escadas em diferentes posições estratégicas, sendo que duas delas não passam por todos os pavimentos. O primeiro e o segundo pavimento contam com muitas divisões entre os ambientes, o que propiciou à futura instalação de um hotel, tornando-se quartos; enquanto o térreo é mais livre e apresenta menos divisões, propiciando à instalação de loja de departamentos futuramente.
FIG. 1) Primeira página do processo – AHWL FIG. 2) Segunda página do processo – AHWL FIG. 3) Terceira página do processo – AHWL
FIG. 4) Planta – terceiro pavimento – AHWL FIG. 5) Planta – segundo pavimento - AHWL
FIG. 6) Planta – primeiro pavimento – AHWL FIG. 7) Planta
FIG. 8) Fachada Rua Quitanda – AHWL FIG. 9) Fachada Rua São Bento – AHWL
b. Compilação bibliográfica referente ao Mappin Stores
Foi possível analisar o edifício do Mappin Stores através do material levantado no AHWL (Arquivo Histórico Washington Luiz) e pesquisas bibliográficas.
Segundo Nelson Leopoldo (2015), assim que inaugurado o Prédio Barão de Iguape, analisado anteriormente, os dois andares superiores foram alugados pelo hoteleiro Daniel Souquières, que instalou o “Grand Hôtel de la Rotisserie Sportsman”. No térreo foi instalada a “Casa Enxoval” de vestuário feminino. No ano de 1912, foi iniciada a demolição do quarteirão definido palas ruas Direita, São Bento, Libero Badaró e Quitanda, que deu origem à futura Praça do Patriarca em homenagem ao Patriarca da Independência, José Bonifácio de Andrade e Silva.
Segundo o autor, em 1919, foi instalada a loja de departamentos Mappin, que permaneceu até 1939. Antes localizada na Rua Quinze de Novembro, a loja buscava um lugar maior devido ao seu crescimento, então se dispôs a alugar todo o Prédio Barão de Iguape. Desalojaram a “Rotisserie Sportsman” e a “Casa Enxoval” e tiveram que adquirir todo o estoque da “Casa Enxoval” para liquidá-lo. A loja Mappin Stores permanece no edifício até o ano de 1939, quando é transferida para sua nova sede na praça Ramos de Azevedo. O edifício passa então a ser ocupado pelo magazine Ao Preço Fixo. Em 1956 ele é demolido, dando origem ao atual edifício arranha-céu Barão de Iguape, conhecido também como “a terceira casa de Barão de Iguape”.
FIG. 10) Prédio Barão de Iguape ainda com a “Rotisserie Sportsman” e a “Casa Enxoval”. Fonte: Acervo da Casa Fretin, apud Barbuy, pg. 109.
FIG. 11) Propaganda do “Grand Hôtel de la Rotisserie Sportsman”, Fonte: Almanaque de 1905 do OESP, pg 3
FIG. 12) Anúncio de 1919 do novo prédio da Mappin Stores, localizado na Praça do Patriarca, ilustração referente à esquina da Rua Direita com a Rua São Bento
FIG. 13) Anúncio referente à liquidação da Casa do Exoval. Fonte: Mappin, Setenta Anos, pg 58
FIG. 14) Anúncio “A Casa para o servir” do Mappin Stores, representando o progresso do Brasil. Fonte: http://www.ibamendes.com/2018/09/anuncios-antigos-das-lojas-mappin.html
FIG. 15) Incêndio ocorrido em 1922. Fonte: https://saopauloantigamente.tumblr.com/page/3
FIG. 16) Mappin Stores – FONTE: https://historiadeempresas.wordpress.com/2012/07/01/mappin-foi-a-liquidacao/
c. Registro e descrição das modificações modernas ocorridas no atual Edifício Barão de Iguape;
Foram coletadas fotos de oito processos referentes ao Edifício Barão de Iguape encontrados no Arquivo Corrente da Prefeitura de São Paulo, (1939-41193; 1939-48662; 1939-50154; 1939-52865; 1939-74588; 1940-27117; 1940-53362; 1940-65377). Todos esses processos foram fotografados, publicados no Banco de Dados do Centro Histórico de São Paulo, analisados e descritos
[1]. O primeiro processo registrado foi de maio de 1939, solicitado por Antonio Mikail, que pede licença para construção do edifício Barão de Iguape na Praça do Patriarca. A descrição publicada no Banco de Dados referente aos processos se resume em:
PROCESSO 1939-0.041.193: Data do processo: 18/05/1939; número do processo: 2005 – 0.00.,026-5; número da capa: 1939 – 0.041.193; reemissão: 04/01/2005; interessado: Antonio Mikail; assunto: Alvará de Reforma
Síntese: Assinado pelo projetista Rafael Visconti, alvará solicita as seguintes modificações do edifício Barão de Iguape: alicerce com concreto de cimento; paredes com alvenaria de tijolo assentes com argamassa de cal e areia; vigamento e madeiramento do telhado de peroba sendo a cobertura com telhas de barro; calhas e condutores de ferro galvanizado; janelas com caixilhos envidraçados; pisos dos WW.CC. serão ladrilhados; revestimento das paredes com argamassa de cal e areia, sendo internamente impermeabilizadas até a altura de 1.50 os WW.CC. e a caixa de escada até a altura de 2.00 as lojas; encanamento de água e esgotos de acordo com a Lei Municipal em vigor; as lajes serão de concreto de areia, pedregulho e cimento, armadas com ferro redondo; as escadas atuais serão demolidas e será construída uma nova escada de concreto armado conforme indica a planta; as portas de ferro atuais serão substituídas por novas; a claraboia existente será retirada e os vãos dos arcos serão fechados com alvenaria de tijolos e janelas serão colocadas conforme a planta.
PROCESSO 1939-48662: Data do processo: 20/06/1939; Número do processo: 1939-48662; interessado: Antonio Mikail; Assunto: Substituição do projeto de reforma; síntese: assinado pelo projetista Rafael Visconti, o processo solicita as seguintes alterações do projeto: alicerces das paredes sobre piso de concreto; paredes em material de celetex e enchimento de concreto armado; calhas e condutores de ferro galvanizados; janelas com caixilhos envidraçados e móveis para ventilação em 2/3 de sua superfície; pisos serão de ladrilho sobre base de concreto nas partes novas. O piso do W.C. será de concreto armado com ferros redondos; revestimento de todas as paredes com pintura e óleo; encanamento de acordo com a R.A.E.; a impermeabilização das paredes dos W.C. e adjacências será em azulejos vidrados até 1.50 de altura; iluminação mínima das lojas corresponderá a 200 lux, será bem distribuída, não brilhante, e terá todas as qualidades exigidas para não haver perturbações na vista das pessoas que trabalham no local;
PROCESSO 1939-50154: Data do processo: 26/06/1939; Número do processo: 1939-50154; Interessado: Antonio Mikail; Assunto: Reconsideração de despacho no processo 48662/39 de substituição de projeto aprovado; Síntese: Antonio Mikail requer a reconsideração do despacho, pelo fato de apresentar o 2º projeto grande melhoria na subdivisão das lojas, aumentando as suas condições higiênicas, de iluminação, ventilação, ao mesmo tempo que melhora fortemente as condições de distinção do local, que é requerida pela situação do prédio, uma das melhores da cidade.
PROCESSO 1939-52865: Data do processo: 07/08/1939; Número do processo: 2005 – 0.001.028-1; Número da capa: 1939 – 0.052.865; Reemissão: 04/01/2005; Interessado: Antonio Mikail; Assunto: Reconsideração do despacho do processo nº 50.154/39 referente à substituição de plantas do processo nº 48.662/39; Síntese: Foram juntadas 5 cópias novas do projeto, procuração necessária e interessado requer alvará de tapume para as partes a serem demolidas para aberturas maiores de vãos de portas.
PROCESSO 1939-74588: Data do processo: 07/10/1939
; Número do processo: 2005 – 0.001.029-0
; Número da capa: 1939 – 0.074.588
; Reemissão: 04/01/2005
; Interessado: Antonio Mikail
; Assunto: Requerimento de vistoria
; Síntese: Engenheiro projetista Rafael Visconti requer vistoria após reforma realizada no edifício.
PROCESSO 1940-27117: Data do processo:15/03/1940
; Número do processo: 1940-27117
; Interessado: Antonio Mikail
; Assunto: Substituição do projeto de reforma do 1º e 29º andar; Síntese: Proprietário Antonio Mikail junta planta aprovada e cópia do novo projeto e requer a aprovação necessária.
PROCESSO 1940-53362: Data do processo: 02/06/1940
; Número do processo: 1940-53362
; Interessado: Correia da Cunha e cia
; Assunto: Requerimento de cópia autêntica das plantas da reforma do edifício.
; Síntese: Correia da Cunha e Cia requer o fornecimento de cópia autêntica das plantas referentes à reforma do edifício. Também requer as seguintes certificações:
em que datas foram aludidas plantas apresentadas à prefeitura;
em que data foi fornecido o “habite-se” para o edifício Barão de Iguape; esclarecem os suplicantes que as plantas foram apresentadas à prefeitura depois do mês de maio de 1939.
PROCESSO 1940-65377: Data do processo: 02/06/1940; Número do processo: 1940-65377; Interessado: Divisão de Fiscalização de Obras Particulares; Assunto: Solicitação de vistoria do revestimento do embasamento do edifício; Motivo: Vários pedaços de mármore caíram.
FIG. 17) Capa do processo 1939-0.041.193. Fonte: Arquivo Corrente da Prefeitura
FIG. 18) Primeira página do processo 1939-0.041.193. Fonte: Arquivo Corrente da Prefeitura
- Relatório de campo (visita in loco)
Como já mencionado, devido à suspensão das atividades acadêmicas presenciais a partir do mês de março, o processo de pesquisa foi prejudicado, pois não foi possível realizar a visita no local e assim, coletar as plantas atuais do edifício. Houve tentativa de entrar em contato com o escritório autor do projeto ou outras fontes que poderiam ter os documentos, porém não se obteve sucesso. Com isso, a análise do edifício atual se baseou em outras fontes bibliográficas e coleta de dados através da internet.
Segundo Nelson Leopoldo (2015), o edifício conta com 37 pavimentos (3 subsolos, um pavimento de lojas, um de sobrelojas, 30 pavimentos-tipo para escritórios e dois do ático), totalizando 25.300m² de área construída. O projeto foi aprovado pela Prefeitura Municipal de São Paulo em 14/02/1956 – alvará número 124.149. O edifício foi construído para sediar o Banco Moreira Salles, por iniciativa de seu diretor-presidente Walter Moreira Salles. 14 dos 37 pavimentos eram destinados ao banco.
Assim como o segundo edifício construído no lote (onde foi instalada a loja Mappin Stores), o volume único de prisma retangular ocupa todo o lote em projeção, segundo Cecília Rodrigues (2014). O edifício conta com caixilharia contínua de alumínio, revestimento dos pilares em granito e mármore e quatro elevadores. Essa circulação vertical está conectada em um volume destacado liberando os pavimentos-tipo, independente da bateria de sanitários localizada próxima das escadas.
Já havia um projeto para o edifício do arquiteto Jacques Pilon, porém Walter Moreira Salles queria incorporar ao projeto a imagem das modernas torres americanas em curtain-wall e estrutura metálica, então encomendou um projeto para o escritório americano Skidmore, Owings and Merril (Louis Skidmore, Nathaniel Owings e John Merril) (SOM), (XAVIER, LEMOS, CORON: 1983, 40). A proposta foi baseada no partido inicial de Jacques Pilon e o projeto executivo foi desenvolvido com o arquiteto Giancarlo Gasperini. Na época os arranha-céus se apresentavam como um dos mais inovadores objetos de experimentação da construção civil.
FIG. 19) Planta Térrea do edifício. Fonte: XAVIER, Alberto, LEMOS, Carlos, CORONA, Eduardo. Arquitetura Moderna Paulistana. São Paulo, Pini, 1983.
- Montagem da cronologia das ocupações no lote
Analisando os mapas a partir da cartografia de 1881, e toda a documentação bibliográfica estudada, foi possível concluir o edifício Barão de Iguape foi a terceira construção no lote onde está atualmente. A primeira ocupação foi a primeira casa do Barão de Iguape, Antonio da Silva Prado, presidente do Banco do Brasil. Era um sobrado na esquina da Rua São Bento com a Rua Direita. Contava com dois pavimentos, 34 janelas com vidraças de sistema guilhotina e grades de ferro e um portão que dava acesso a um pátio interno de distribuição através da Rua Direita. O térreo passou a ser alugado para lojas após a mudança do Barão de Iguape e o pavimento de cima pelo Hotel de França. O Barão de Iguape faleceu em 1875, porém a edificação continuou sendo muito requisitada pelos comerciantes. O térreo passou a ser alugado para lojas e o pavimento de cima pelo Hotel de França (LEOPOLDO, NELSON 2015).
Segundo o autor, o número 34 (Fig. 25) era a velha casa de Barão de Iguape, construída em taipa. Era considerada uma das melhores de São Paulo, pagando o maior Imposto Predial da quadra e da rua (600$000 reis) em 1886. Em 1910, foi feito o pedido de construção do Prédio Barão de Iguape, feito por sua neta Condessa Pereira Pinto (Ana Brandina Prado Pereira Pinto). Foi construído na ocupação dos lotes 30, 32 e 34 pela empresa Ramos de Azevedo, Severo & Comp. (Fig. 25)
FIG. 20 ) 1881 – ARQUIAMIGOS. É perceptível um grande vazio no centro do lote.
Fig. 21) 1930 – SARA BRASIL. O lote se abre para a Praça Do Patriarca, dando uma monumentalidade ao edifício.
Fig. 22) 1954 – VASP CRUZEIRO. Prédio que ocupava o lote, 2 anos antes de ser demolida para a construção do edifício Barão de Iguape). Nesse mapa, é perceptível o átrio central do Prédio Barão de Iguape, onde foi instalada a Mappin Stores anteriormente.
Fig. 23) Foto de 1887. Número 31 se refere ao sobrado de Barão de Iguape. Nessa época, ele não morava mais no sobrado, teria doado a sua sobrinha Condessa Pereira Pinto desde 1870. Em frente (número 23) está situado o sobrado de 9 janelas onde morou Brigadeiro Jordão (tio de Barão de Iguape). Fonte: BRAGHITTONI, NELSON LEOPOLDO. Diálogo: Rua/Cidade: o caso da Rua Direita em São Paulo (1765-1977). Tese de Doutorado, São Paulo, FAUUSP, 2015
Fig. 24) Envelope e papel de carta do Hotel de França de 1886 com o número 34. Fonte: BRAGHITTONI, NELSON LEOPOLDO. Diálogo: Rua/Cidade: o caso da Rua Direita em São Paulo (1765-1977). Tese de Doutorado, São Paulo, FAUUSP, 2015
Fig. 25) Detalhe da Planta Cadastral e Comercial da cidade de São Paulo. Editores: THOMAS & CIA. Editada em 1911, trazia em vermelho, as linhas de bonde da capital. Fonte: BRAGHITTONI, NELSON LEOPOLDO. Diálogo: Rua/Cidade: o caso da Rua Direita em São Paulo (1765-1977). Tese de Doutorado, São Paulo, FAUUSP, 2015
Fig. 26) Edifício Barão de Iguape. Fonte: https://www.arquivo.arq.br/edificio-barao-de-iguape
Fig. 27) Rua da Quitanda com Rua São Bento. 1911. Fonte: http://www.inci.org.br/acervodigital/pesquisalocalidade.php?paginafotografia=5020&id=fotografias&localidade=&inicio=&termino=
Fig. 28) Os “Quatro Cantos”, na maquete do acervo do Museu Paulista. No alto, à esquerda está a cada do Barão de Iguape e à direita o Grande Hotel da França. As duas casas de baixo tinham funções comerciais. ( Fonte: Ilustração de Luiz Fernando Marini sobre foto de B. L. Toledo.
Fig. 29) Rua Direita com Rua São Bento. 1905. Fonte: Acervo B. L. Toledo
f. Inserção dos elementos da pesquisa no banco dados e liberação das informações para o site “Edifício nos Centro de São Paulo”.
Todos os processos registrados foram atualizados, descritos e postados no banco de dados.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer da pesquisa foram coletados novas fontes bibliográficas, imagens e processos, que foram anexados aos conteúdos do Banco de Dados do Centro Histórico de São Paulo. Todos esses processos analisados são de extrema importância, pois trazem desde informações sobre o projeto inicial do edifício colonial no qual o Mappin se instalou, até mudanças e reformas no atual edifício moderno.
As análises das ocupações anteriores no lote onde se encontra hoje o Barão de Iguape, através da cartografia (de 1881, 1920, 1954 e atual), registros e iconografia, permitiram descrever sucessivas ocupações, que alteraram estilos, gabaritos, em sincronia com as transformações urbanas, que promoveram alargamento de ruas, construção de viadutos e praças, permitindo a construção do arranha-céu moderno no eixo Barão de Itapetininga, Viaduto do Chá e Praça do Patriarca. Esta talvez seja a condição mais peculiar dos edifícios modernos construídos no centro de São Paulo: eles não podem atar-se incondicionalmente aos princípios modernos de isolar-se no lote, ou gleba, em razão de uma melhor salubridade ou idealidade: eles nascem tópicos vinculados à morfologia da cidade tradicional: a torre envidraçada, que aparentemente ergue-se solta no espaço, tem o corpo dos elevadores encostado na edificação vizinha de menor porte, situada na Rua Direita; confirmando o pressuposto (Ribeiro, 2010) .
6. REFERÊNCIAS
CARRILHO, Marcos José; RODRIGUES DOS SANTOS, Cecilia H. G; RIBEIRO, Alessandro José Castroviejo; DEL NEGRO Paulo Sérgio B. I
nterfaces entre experiências: contribuições da documentação e da pesquisa para a prática projetual e para a crítica da arquitetura e do urbanismo. 6º Projetar, Salvador, Ba, 2013.
CAMPOS, Candido Malta.
Os Rumos da Cidade: Urbanismo e Modernização em São Paulo. São Paulo, Editora Senac, 2002.
FIALHO, Roberto Novelli. Edifícios de escritórios na cidade de São Paulo. 2007. Tese (Doutorado em Projeto de Arquitetura) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007.
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Contatos: juliap.borges@hotmail.com / alessandro.castroviejo@gmail.com
[1] Em razão das suspensão das atividade presenciais não foi possível localizar as imagens das plantas referentes aos processos; que encontram-se no IPHAN-SP.